terça-feira, 30 de abril de 2019

Sapiens e Homo Deus


Os dois volumes Sapiens e Homo Deus, são na verdade, duas partes de uma única obra. Ambos expressam a tese de Yuval Noah Harari de que a ciência de fronteira (Fringe Science) já  chegou num ponto de não retorno, onde vai passar a cometer os mesmos excessos que foram imaginados pela ficção científica.

São dois livros de divulgação científica embalados e vendidos como se fossem livros de História. Não estou afirmando que as duas obras não contém História, afinal o autor é um Historiador. Estou apenas pontuando que a dose de divulgação científica e futurismo, é maior do que a maioria das pessoas está acostumada.

Embora Sapiens e Homo Deus sejam dois best-sellers, ainda assim podemos tranquilamente classificar o assunto dos livros como cultura underground. Apenas um nicho específico dos leitores vão ler as duas obras pelo seu valor intrínseco e não pela popularidade que as mesmas atingiram na mídia.

Os livros exigem bastante atenção dos leitores, para entender que a espécie humana, que começou em algum lugar do continente africano, num passado remoto, pode se dirigir para um beco sem saída.

Sapiens aborda o passado e o presente, enquanto Homo Deus contempla o futuro.
                              

Sapiens - Uma breve história da humanidade

Em Sapiens, o autor faz um balanço do que funcionou e do que não funcionou na História humana. Analisa o que podia ser melhor e até faz uma crítica das instituições humanas aparentemente inquestionáveis como a Agricultura.

Questiona a nossa negligência com os direitos dos animais e com práticas cruéis de abate e de criação, que segundo o autor, não combinam com o grau de desenvolvimento tecnológico que temos em outras áreas. Adaptando um tipo de hierarquia das necessidades humanas de Maslow para a História, Harari divide a História em três revoluções. A revolução cognitiva, a revolução da agricultura e a revolução científica.

Seguindo essa lógica, a agricultura atendeu as necessidades primárias de subsistência e só então a ciência pôde se desenvolver. Com a revolução científica, astronautas foram enviados a Lua e cientistas puderam explorar a física das partículas subatômicas nos aceleradores de partículas. As revoluções humanas seguem uma hierarquia de prioridades, primeiro a revolução da agricultura (subsistência básica) e depois a revolução científica (conhecimento).

A agricultura nos libertou de tarefas que tomavam quase todo nosso tempo na luta pela sobrevivência, quando éramos caçadores-coletores. A criatividade, o talento e as realizações pessoais, são necessidades humanas associadas à revolução científica.

Com mais qualidade de vida e com mais tempo livre, a tecnologia e a ciência deveriam facilitar a nossa vida, encaminhando a maioria da humanidade para a satisfação das suas necessidades de conhecimento, conforto e realização pessoal.

O autor prossegue analisando porque nem sempre isso acontece, devido a desigualdade entre os países e a má distribuição de renda.

Nesse ponto, o autor já começa a tecer argumentos envolvendo uma nova agenda secreta da humanidade, o assunto predominante do seu próximo livro.

                             
Homo Deus - Uma breve história do amanhã

No livro Homo Deus, o autor se volta diretamente para o futuro e para projetos científicos dignos do seriado Fringe, como o projeto Gilgamesh da imortalidade e a nova seita dos dataístas do Vale do Silício (qualquer semelhança com a corporação Massive Dynamics não é mera coincidência).

O livro nos lembra de paralelos históricos que podemos traçar entre a antiga monarquia dos faraós egípcios, com os sonhos mais desvairados dos "faraós da tecnologia" da nossa sociedade atual.

A coleta, a manipulação para uso comercial e o processamento da informação se tornam as principais diretrizes dos asseclas da seita dataísta. Todo o resto, incluindo parte da cultura humana  que não foi digitalizada é descartável.

Os dataístas reduzem a informação semântica que é lida e interpretada pelos organismos sencientes à "informação" que é facilmente processada pelas máquinas.

A promessa da Web Semântica pode trazer várias coisas boas no futuro, como uma interface mais direta entre humanos e máquinas,  mas também eleva a capacidade das máquinas no que tange a emulação do pensamento humano através de algoritmos. Harari nos diz que essa fé exagerada na informação, poderá ser a nossa ruína.

Nesse cenário distópico, os seres humanos seriam meros peões, responsáveis pelo fornecimento de informação de forma passiva e em grande quantidade.

A produção constante de informação pessoal, atenderia as agendas dos monarcas da internet. Não por coincidência, os mesmos monarcas seriam os donos das biotecnologias que aumentam o tempo de vida e que promovem a melhoria das capacidades físicas.

Parece coisa de algum roteiro de filme de Hollywood, porém é um alerta escrito por um historiador e intelectual, com vasta experiência em geopolítica e História mundial.

Fica aqui registrada, a minha recomendação de leitura dessas duas obras instigantes sobre a espécie humana e o seu futuro.

2 comentários:

  1. Dois livros muito interessantes, pelo que tu descreveu. Eles tem muito em comum com uma disciplina que cursei na faculdade de Psicologia: Fundamentos Ecológicos e Evolutivos do Comportamento Humano, especialmente quando diz que:

    "A agricultura nos libertou de tarefas que tomavam quase todo nosso tempo na luta pela sobrevivência".

    De acordo com essa disciplina que aborda os Fundamentos Ecológicos e Evolutivos do Comportamento Humano, com investimento parental de tempo e recursos a prole humana começa a depender dos pais por um período mais longo, acarretando um período de aprendizado prolongado e portanto uma capacidade maior para armazenar informações e para adquirir experiências de vida, isso proporcionou o aumento e desenvolvimento cerebral, permitindo novos desenvolvimentos culturais.

    Na relação entre natureza e cultura está a origem das práticas culturais, rituais e crenças, um cérebro maior permite novos desenvolvimentos culturais e um novo contexto cultural promove a seleção de uma nova especialização cerebral. A linguagem seria um produto da ação da evolução sobre comportamentos culturais. Temos aptidão natural para a cultura e aptidão cultural para desenvolver a natureza humana, somos produtores e produto da cultura.

    Sem dúvida são livros de conteúdo também no que tange ao tema da manipulação da informação, alertando a fazer uma análise crítica da informação para não virarmos marionetes dos faraós da tecnologia.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Muito bom o comentário, você entendeu bem o post.

      A minha resenha é apenas uma amostra dos livros, para termos uma ideia básica do que eles tratam.

      Espero que outros leitores do blog também se interessem por esses livros, pois esses até que são bem famosos.

      Excluir