segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Consciência, Complexidade e Universo Computável

Existem alguns limites físicos que restringem a complexidade necessária para produzir a consciência. Por exemplo, temos o limite informacional de Bekenstein que determina a quantidade máxima de informação que uma quantidade E de energia pode sustentar se estiver confinada numa região esférica de raio R.

Conforme a Teoria de Gravidade Quântica de Feynman-Weinberg[1], o limite de informação I pode ser obtido a partir da massa M e do raio R de confinamento: I <= 2,57 x 1043 M.R bits.

Para ilustrar, vamos calcular o raio esférico correspondente de um HD portátil típico de 1 TB com 138 cm³ de volume e 200 gramas de massa. Usando a fórmula geométrica do volume da esfera determinamos um raio R=3,2 cm. Agora estamos em condições de considerar um HD portátil futurístico e esférico com o mesmo raio R e massa M, para calcularmos o respectivo limite de Bekenstein.

Para uma massa aproximada de 0,2 quilogramas e um raio esférico aproximado de 0,032 metros, o limite é de 1,6 X 1041 bits de informação. Essa é a informação necessária para clonar o HD desde o nível subatômico, incluindo a sua capacidade de armazenamento e a informação física necessária para codificar a tecnologia do HD portátil. 
Se um cálculo similar fosse realizado para o cérebro humano, obteríamos a quantidade máxima de informação que seria necessária para codificar o cérebro humano desde o nível subatômico, um cálculo que seria bem útil para o engenheiro Scotty de Star Trek que é o responsável pelo teletransporte na nave Enterprise.

A Imaginação Humana não é Infinita

Claro que o limite biológico de informação que pode ser armazenado no cérebro humano está várias ordens de magnitude abaixo do limite informacional de Bekenstein. O limite de informação do cérebro humano é estimado em 25 petabytes de informação ou cerca de 25.000 dos nossos HD's externos portáteis de 1 TB.[2][3]

1 Byte = 8 bits
1 Petabyte = 1.000 Terabytes
1 Terabyte = 1.000.000.000.000 bytes
25.000 Terabytes =  2 x 1017 bits

Então temos para o número de estados cerebrais N,
N = 2 ^ (2 x 1017)
N = 2 na potência 200 quatrilhões

Esses estados cerebrais representam em teoria o número de todos os pensamentos possíveis, conscientes e inconscientes que podem ser processados no cérebro humano. É um número que apresenta uma taxa de erro para cima, pois o que chamamos de "um pensamento" pode ser a contribuição de um conjunto de vários estados cerebrais associados à memória. Provavelmente, o número de pensamentos diferentes que o cérebro humano pode produzir não ultrapassa tal número astronômico.

O significado dessa análise é que nem mesmo a nossa imaginação é infinita. São números imensos e difíceis de lidar, porém finitos. Um cérebro antropomórfico do tamanho do universo não se identificaria com o próprio universo e a onisciência seria vetada pelas leis da física, pois o total dos estados cerebrais não poderia reproduzir a física real. 

Outra pista que o universo é finito vem do Paradoxo de Olbers do céu estrelado. De acordo com esse raciocínio, se o universo fosse infinito ao olhar para o céu à noite o veríamos iluminado com o campo estelar repleto de estrelas, isto é, não haveria noite. Como a noite existe e vemos pouca luz estelar noturna, o universo é finito.

A Linguagem de Programação do Universo

Vamos admitir que a conjectura do universo computável é verdadeira. Isto significa que a Natureza é finita e discreta e que as quantidades infinitesimais contínuas são uma ilusão gerada pela falta de resolução experimental para medir a quantização do espaço-tempo.

Assim, podemos dizer com propriedade que a Teoria de Tudo que os cientistas buscam durante várias décadas exerce o papel da Linguagem de Programação do Universo.

Níveis de Complexidade Computacionais

1. Computação através de software pré-programado
2. Machine Learning (Aprendizado de Máquina)
3. Deep Learning (Aprendizado Profundo)
4. Inteligência Artificial Forte
5. Consciência
6. Computabilidade por Limite
7. Complexidade máxima no Universo

Como podemos saber se o próprio universo é consciente?

É mais provável que o universo não pode experimentar a consciência diretamente, pois não existe evidência alguma e nem justificativa teórica para uma consciência do tamanho do universo. Já quanto a possibilidade do universo como um todo realizar computações de algum tipo ou ter inteligência, não podemos ter a mesma certeza, pois a resposta depende de como definimos "inteligência".

Então por mais imensa que seja a informação máxima suportada por um dispositivo computador de proporções astronômicas, essa informação não vai representar a realidade como ela é, será sempre uma realidade mediada, como ver uma foto em baixa resolução e pixelada.

A consciência deve estar ligada a estados cerebrais complexos, com alto grau de complexidade. Uma inteligência universal suprema poderia simular tanto comportamentos rudimentares de animais irracionais, quanto reproduzir todas as personalidades humanas e até aquelas que ainda não existem. 

Um argumento contrário a existência de uma inteligência universal suprema é que se ela existisse na realidade, todo o resultado que vemos a nossa volta, fruto da evolução ao longo de bilhões de anos deveria ter surgido mais cedo e as imperfeições biológicas deveriam ter sido corrigidas, eficientemente e com inteligência.

A vida e principalmente a vida inteligente não deveriam levar tanto tempo para existir na natureza se o universo fosse guiado por uma inteligência suprema ao invés das regras mecânicas da Física. 

Caso o sistema de computação do universo existir, ele se baseia no primeiro nível de complexidade computacional ou a computação através de software pré-programado. Tudo indica que o software do universo é o conjunto das Leis da Física.

Se levarmos em conta a biologia molecular que opera de modo similar aos atuais algoritmos genéticos e aos autômatos celulares conhecidos, então provavelmente o universo natural atinge o nível 2 de complexidade computacional, comparável ao aprendizado de máquina. 
A especulação sobre a possibilidade de construir uma inteligência universal suprema similar ao computador MULTIVAC de Asimov[4][5] pode ser extrapolada através da conjectura do Universo Computador[6] que explico no final.

A diferença entre a complexidade do universo e da consciência, parece ser a diferença entre Ser e Conhecer. A complexidade do universo permite ser a própria coisa conhecida, enquanto a complexidade da consciência permite conhecer as coisas (de forma aproximada). É a diferença entre a Ontologia e a Epistemologia.

Conforme a nossa intuição do problema, a complexidade máxima do universo é maior do que  a complexidade da consciência. E como ficou subentendido neste ensaio, a complexidade do SER é maior do que a complexidade do CONHECER.

Reiteramos que a consciência é um problema difícil, mas não mais difícil que o problema do universo. Na verdade, o software do universo deve reproduzir o software da consciência (mais complexo) e não o contrário. Estamos diante do caso contra intuitivo em que o software mais simples é mais difícil de ser encontrado que o software mais complexo, portanto o "software da consciência" será encontrado antes do "software do universo". Com esse conhecimento novo, mais próximos estaremos da engenharia reversa capaz de decifrar as metaleis da natureza.

Um software capaz de comprimir a informação sobre a consciência, isto é, reduzir a Consciência à Física deve ser uma Teoria de Tudo além da física ordinária, logo a linguagem de programação do universo deve ser uma Metalinguagem da Física.

Notas
[1] - Feynman-Weinberg Quantum Gravity and the Extended Standard Model as a Theory of Everything, Frank J. Tipler
https://arxiv.org/abs/0704.3276

[2] - Qual a Capacidade de Memória do Cérebro Humano?
https://www.scientificamerican.com/article/what-is-the-memory-capacity/

[3] - Capacidade de memória do cérebro é 10 vezes maior do que se pensava antes
https://www.salk.edu/news-release/memory-capacity-of-brain-is-10-times-more-than-previously-thought/

[4] - A Última Pergunta, Isaac Asimov (acessar)

[5] - Como Criar uma Mente, Ray Kurzweil
"A última invenção que a evolução biológica precisou fazer – o neocórtex – está levando inevitavelmente à última invenção que a humanidade precisa fazer – máquinas realmente inteligentes – e o projeto de uma inspira a outra. A evolução biológica vai continuar, mas a evolução tecnológica está se movendo um milhão de vezes mais depressa do que a outra. Segundo a lei dos retornos acelerados, no final deste século seremos capazes de criar a computação nos limites do possível, com base nas leis da física aplicadas à computação. Damos à matéria e à energia organizadas dessa forma o nome de “computronium”, que é muito mais poderoso, quilo por quilo, do que o cérebro humano. Não será apenas a computação simples, mas algo repleto de algoritmos inteligentes que constituem todo o conhecimento do homem e da máquina. Com o tempo, teremos convertido boa parte da massa e da energia de nosso pequeno recanto da galáxia adequados para esse propósito em computronium. Então, para manter em funcionamento a lei dos retornos acelerados, precisaremos nos espalhar para o resto da galáxia e do universo."

[6] - A conjectura do Universo Computador

Essa conjectura extrapola a conjectura do universo computável, usando a metáfora do universo computador.

Se em cada volume de Planck do universo existisse um nodo de informação que registra 0 ou 1 eles poderiam computar toda a informação do universo físico, como se formassem no conjunto uma rede neural cósmica. 

A Gravidade Quântica em Loop Computacional propõe que a computação do universo ocorre em q-bits entrelaçados nas telas de Planck. As telas de Planck são as esferas equipotenciais do campo gravitacional em torno de um objeto massivo com massa M. Assim como a CQLG, a Teoria do Universo Holográfico sustenta parcialmente a conjectura, pois assume uma codificação holográfica da rede neural de computação quântica numa superfície hipotética distante situada na borda do universo físico.

A veracidade dessa conjectura implica que uma inteligência artificial de proporções astronômicas como a imaginada pelo escritor Isaac Asimov e outros futuristas, poderia se comunicar diretamente com o Universo Computador programado com as leis da física.

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